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segunda-feira, 23 de abril de 2012

Da academia ao mercado, jovens empresas no caminho da inovação


Membranas para uma melhor filtração da cerveja, sistemas que aceleram a previsão de desastres naturais e um medidor de ondas mais preciso e barato. Esses são alguns produtos de iniciativas que nasceram na Incubadora de Empresas de Base Tecnológica da Coppe, na Universidade Federal do Rio de Janeiro, e que hoje ocupam um espaço no disputado Parque Tecnológico da UFRJ.

Localizadas ao lado de Schlumberger, General Electric, Usiminas e outras grandes empresas, a Pam Membranas Seletivas, Aquamet e Ambidados são alguns exemplos de empreendimentos que estão contribuindo para a inovação brasileira dentro do Parque, que tem 350 mil metros quadrados e deve oferecer cinco mil empregos até 2015. Além disso, essas jovens empresas (não necessariamente fundadas por jovens pesquisadores) representam a concretização de um dos maiores desafios tecnológicos do País: a transição do conhecimento das universidades para o mercado. Justamente um dos objetivos da incubadora.

"Nosso típico empresário é o pesquisador. E na incubadora abre-se para ele outro mundo. Nós ajudamos nessa passagem, que é muito dolorosa porque ele tem que mudar do olhar do produto para o olhar do mercado", conta Lucimar Dantas, gerente de operações da incubadora da Coppe. "Muitos acham que seus produtos vão revolucionar o mundo porque colheram os louros da inovação na universidade. Chegar aqui é um banho de água fria", acrescenta.

Membranas e chopp - Dolorosa ou não, a passagem de Ronaldo Nóbrega, um dos fundadores da Pam Membranas, é um exemplo de êxito. Com pós-doutorado no currículo e 35 anos na área de pesquisa e desenvolvimento na UFRJ, Nóbrega criou esta que é a primeira empresa de produção de membranas de microfiltração no Brasil, nascida de um spin-off do Laboratório de Processos de Separação com Membranas da Coppe.

Ele conta que o trabalho de décadas não encontrou espaço no mercado até o início dos anos 2000, principalmente depois do aumento da preocupação com a escassez de água. Já prestes a se aposentar, decidiu abrir a empresa com outros professores, todos engenheiros químicos. Inicialmente, o nicho identificado era atender fabricantes de purificadores residenciais, mas com o tempo as atividades se diversificaram. Em 2005 eles começaram a produzir as primeiras membranas na incubadora. A demanda principal surgiu do mercado industrial, sempre focando na reutilização da água, e com o tempo foram desenvolvidas membranas de micro, ultra e nanofiltração, além da osmose inversa e pervaporação. As de ultra e microfiltração têm forma de tubos capilares (fibras ocas), feitas a partir de resinas comerciais.

A empresa, que hoje conta com cerca de 30 funcionários, começou a adaptar os equipamentos para produzir também módulos, além de realizar outras etapas do processo. O resultado é que hoje as membranas criadas por eles têm aplicações diversas, como o tratamento de água visando o consumo humano; tratamento de esgotos sanitários e industriais; tratamento de vinhoto da cana (extraindo dele a água de volta e produzindo fertilizante); membranas para hemodiálise e membranas que substituem a tecnologia convencional de filtragem de cerveja, um dos casos mais interessantes.

No fim do processo convencional de fabricação de cerveja, usam-se tubos com tecidos que retêm as leveduras da fermentação. Para isso, é necessário adicionar terras diatomáceas, que formam uma camada nesse tecido. "O problema é que se gera um passivo ambiental nesse processo, com a terra e o material orgânico, que não serve para nada", detalha Nóbrega. A ideia é substituir isso pela microfiltração. Ele conta que quando se filtra da maneira clássica, não é possível remover 100% dos microorganismos, "por isso o chope tem validade curta, diferentemente da cerveja, que é pasteurizada". "A microfiltração faz uma filtração 'estéril' a frio. Então você poderia até engarrafar chope", revela. A tecnologia ainda está em testes, na unidade do Senai em Vassouras (RJ), onde há uma escola de mestres cervejeiros.

Previsão de chuvas extremas e boias - Outro projeto de destaque é o sistema Spreme, que foi desenvolvido pela empresa Aquamet, originada na incubadora da Coppe em 2007 e que em 2012 se instalou no Parque Tecnológico da UFRJ com seus 10 funcionários. Usando o radar modelo banda C doppler de dupla polarização comprado na Finlândia pela Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), o sistema promete previsões shortcast (de curto tempo) mais rápidas e está em testes em Minas Gerais.

O novo sistema é capaz de prever e quantificar chuvas extremas, potenciais causadoras
de desastres, com antecedência de 24 horas, fornecendo informações de hora em hora. Um avanço em relação aos atuais sistemas de previsão, que são atualizados no máximo a cada seis horas, já que os dados são enviados a receptores nos Estados Unidos. O novo sistema encurtaria esse processo, tornando mais ágil a tomada de providências, pois alguns eventos extremos se formam em menos de seis horas. Além disso, atualmente, é possível prever se vai chover muito, mas, com o novo recurso, será mais fácil quantificar essa chuva, já que esse radar faz uma espécie de "tomografia" das nuvens.

Marés - Ainda dentro da área de monitoramento ambiental, a Ambidados, criada em 2006, também se destaca entre as novas empresas do Parque, fornecendo informações de correntes, marés e ondas por meio de sensores. Eduardo Almeida Azevedo, engenheiro e especialista em pesquisa e projetos da Ambidados, destaca o sistema de monitoramento Ondaleta, desenvolvido no Brasil pelo Cenpes (Centro de Pesquisas e
Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello) e pela Petrobras. Quando um navio atraca no porto, é necessário ter as informações sobre ondas e marés para que elas não influenciem na retirada do material do barco, e o sensor viabiliza essas informações.

O equipamento, atualmente implantado em portos da Vale no Espírito Santo, consiste em um tubo de cobre que fica no mar, com um sensor de pressão que indica as variações da maré. O processamento permite saber o tamanho das ondas, por exemplo, ao longo de meses, o que pode guiar a chegada de diferentes tipos de materiais de acordo com a época do ano.

"Aprimoramos a portabilidade, o processamento e o transformamos numa solução mais comercial, além de desenvolvermos a parte da transmissão por internet", detalha Azevedo. Além disso, o Ondaleta resultou em uma opção mais barata do que as dos concorrentes, que eram importados, chegando a custar 30% de um sensor estrangeiro. "Sem contar que alguns nem têm suporte no Brasil e esse é um diferencial da Ambidados", lembra Azevedo.

A empresa também atua para a indústria offshore, em áreas profundas e distantes da costa, por meio do desenvolvimento de boias oceanográficas. Elas têm diferentes aplicações e podem medir correntes, temperatura, salinidade, além de servirem como estações metereológicas. A ideia é monitorar a costa brasileira, em parceria com o Cenpes e a Universidade de São Paulo. Em comparação com Europa e Estados Unidos, ainda há pouquíssimas boias no Brasil. Mas com o pré-sal, o interesse por elas vem aumentando. Azevedo lembra que os últimos tsunamis na Ásia foram previstos por boias desse tipo.

Ele destaca que o monitoramento ambiental do mar por sensores não é importante apenas para orientar manobras de navios, "mas também no caso de algum vazamento, para indicar a direção aonde o óleo vai". A empresa hoje conta com cerca de 30 funcionários, entre engenheiros, oceanógrafos, metereologistas, analistas de sistemas e físicos.
(Clarissa Vasconcellos - Jornal da Ciência)