Por José Tadeu Arantes
O pesquisador Oswaldo Alves, do Instituto de Química da Unicamp, um dos autores (foto: Antoninho Perri/Unicamp) |
Agência FAPESP – Com mais de 400 páginas, distribuídas por 17 capítulos, cada qual abordando em profundidade um aspecto da nanotoxicologia, o livro Nanotoxicology – Materials, Methodologies, and Assessments disponibiliza o que há de mais avançado na área e suas contribuições originais.
Fruto de discussões que se estenderam por mais de uma década, a obra é um trabalho coletivo de 54 pesquisadores, sob a coordenação de Nelson Durán e Oswaldo Alves, do Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e de Silvia Guterres, da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O prefácio, o sumário e abstracts dos capítulos podem ser acessados em http://link.springer.com/book/10.1007/978-1-4614-8993-1.
Oswaldo Alves falou sobre o livro à Agência FAPESP. Confira a seguir a entrevista:
Agência FAPESP – Quando surgiu a ideia que resultou no livro?
Oswaldo Alves – A ideia desse livro surgiu há muito tempo. Em 2002, iniciamos discussões que tratavam dos eventuais riscos das nanotecnologias para o meio ambiente e o homem. Essas discussões eram, na verdade, muito difíceis, pois tanto na academia quanto em vários setores do governo havia uma espécie de apreensão de que as pessoas tivessem receio das nanotecnologias. Apesar disso, ratificávamos, em várias instâncias, a necessidade de que fosse abordado esse aspecto crucial para o desenvolvimento das nanotecnologias. Nosso pensamento foi mais e mais reforçado após participarmos das conferências Nanosafe, em Grenoble, na França, e, principalmente, como delegado brasileiro, na OECD Conference on Potential Environmental Benefits of Nanotechnology: Fostering Safe Innovation-Led Growth, promovida pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em Paris, em julho de 2009. Além disso, os laboratórios de Química do Estado Sólido (LQES) e de Química Biológica (LQB), ambos do Instituto de Química da Unicamp, vinham, há mais de 10 anos, trabalhando com os diferentes aspectos ligados à interação de nanoestruturas com biossistemas, dentro da perspectiva da nanotoxicologia, em cooperação com mais de 20 laboratórios, em sua maioria ligados às Ciências Biológicas.
Oswaldo Alves – A ideia desse livro surgiu há muito tempo. Em 2002, iniciamos discussões que tratavam dos eventuais riscos das nanotecnologias para o meio ambiente e o homem. Essas discussões eram, na verdade, muito difíceis, pois tanto na academia quanto em vários setores do governo havia uma espécie de apreensão de que as pessoas tivessem receio das nanotecnologias. Apesar disso, ratificávamos, em várias instâncias, a necessidade de que fosse abordado esse aspecto crucial para o desenvolvimento das nanotecnologias. Nosso pensamento foi mais e mais reforçado após participarmos das conferências Nanosafe, em Grenoble, na França, e, principalmente, como delegado brasileiro, na OECD Conference on Potential Environmental Benefits of Nanotechnology: Fostering Safe Innovation-Led Growth, promovida pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em Paris, em julho de 2009. Além disso, os laboratórios de Química do Estado Sólido (LQES) e de Química Biológica (LQB), ambos do Instituto de Química da Unicamp, vinham, há mais de 10 anos, trabalhando com os diferentes aspectos ligados à interação de nanoestruturas com biossistemas, dentro da perspectiva da nanotoxicologia, em cooperação com mais de 20 laboratórios, em sua maioria ligados às Ciências Biológicas.
Agência FAPESP – Como foram articuladas as colaborações de tantos pesquisadores?
Alves – Em 2011, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) lançou um edital que possibilitou a criação da Rede de Nanotoxicologia de Compostos Nanoestruturados – Citotoxicidade e Genotoxicidade de Produtos com Potencial Industrial (CigeNanotox), baseada no Instituto de Química da Unicamp e coordenada pelo professor Nelson Durán e por mim, com participação da Faculdade Metrocamp, da Universidade de Sorocaba, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), da Unicamp, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da UFRGS. Um dos “produtos” propostos pela Rede, além do desenvolvimento de protocolos e métodos, publicações em revistas especializadas, participação em congressos internacionais e depósito de patentes, entre outros, foi a publicação de um livro que tratasse da área emergente da nanotoxicologia. Fizemos uma proposta para a editora Springer, que prontamente a aceitou. A partir desse momento, foi desenvolvida pelos editores toda a atividade editorial, com a revisão dos textos pelos pares, autorização para uso de imagens e figuras e revisão final dos originais. Destaque-se neste processo a participação ativa de pós-doutores e estudantes de pós-graduação, muitos dos quais participaram como coautores em vários capítulos, com pesquisadores/professores sêniores.
Alves – Em 2011, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) lançou um edital que possibilitou a criação da Rede de Nanotoxicologia de Compostos Nanoestruturados – Citotoxicidade e Genotoxicidade de Produtos com Potencial Industrial (CigeNanotox), baseada no Instituto de Química da Unicamp e coordenada pelo professor Nelson Durán e por mim, com participação da Faculdade Metrocamp, da Universidade de Sorocaba, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), da Unicamp, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da UFRGS. Um dos “produtos” propostos pela Rede, além do desenvolvimento de protocolos e métodos, publicações em revistas especializadas, participação em congressos internacionais e depósito de patentes, entre outros, foi a publicação de um livro que tratasse da área emergente da nanotoxicologia. Fizemos uma proposta para a editora Springer, que prontamente a aceitou. A partir desse momento, foi desenvolvida pelos editores toda a atividade editorial, com a revisão dos textos pelos pares, autorização para uso de imagens e figuras e revisão final dos originais. Destaque-se neste processo a participação ativa de pós-doutores e estudantes de pós-graduação, muitos dos quais participaram como coautores em vários capítulos, com pesquisadores/professores sêniores.
Agência FAPESP – Este livro é uma iniciativa pioneira em nanotoxicologia?
Alves – Certamente existem outras obras que tratam do assunto. Porém, o número é pequeno. Dada a abrangência, o estágio das discussões sobre o tema e a forma como os assuntos foram tratados, não temos dúvida em considerar nosso livro uma contribuição pioneira e muito oportuna. Além da apresentação atualizada da literatura internacional de alta qualidade, acrescentamos desenvolvimentos metodológicos, resultados obtidos e reflexões oriundas dos diferentes laboratórios que compõem a Rede CigeNanotox e colaboradores.
Alves – Certamente existem outras obras que tratam do assunto. Porém, o número é pequeno. Dada a abrangência, o estágio das discussões sobre o tema e a forma como os assuntos foram tratados, não temos dúvida em considerar nosso livro uma contribuição pioneira e muito oportuna. Além da apresentação atualizada da literatura internacional de alta qualidade, acrescentamos desenvolvimentos metodológicos, resultados obtidos e reflexões oriundas dos diferentes laboratórios que compõem a Rede CigeNanotox e colaboradores.
Agência FAPESP – Existe hoje um grande interesse no uso de nanopartículas como vetores de drogas farmacêuticas com atuação bastante específica. Em que estágio estão as pesquisas na área?
Alves – Sem dúvida, é um campo que desperta grandes expectativas. Para serem utilizadas como vetores de fármacos, as nanopartículas são funcionalizadas com diferentes grupos, que as dotam de novas propriedades, como solubilidade, reatividade, capacidade de transferir energia e, até mesmo, reconhecimento de eventuais células que apresentem “mau funcionamento”, como as células cancerígenas. Apesar de muitos avanços terem sido feitos, tanto em experimentos in vitroquanto in vivo, ainda são muito poucos os sistemas que já venceram todas as fases de testes para atingir o mercado. Existem muitas dúvidas sobre como esses sistemas de fato funcionam, principalmente quanto ao reconhecimento e à interação das nanopartículas com as diferentes proteínas, mas já há vários sistemas candidatos em avaliação nas agências europeias e na FDA [Food and Drug Administration] norte-americana, especialmente focando o tratamento dos tipos mais agressivos de câncer.
Alves – Sem dúvida, é um campo que desperta grandes expectativas. Para serem utilizadas como vetores de fármacos, as nanopartículas são funcionalizadas com diferentes grupos, que as dotam de novas propriedades, como solubilidade, reatividade, capacidade de transferir energia e, até mesmo, reconhecimento de eventuais células que apresentem “mau funcionamento”, como as células cancerígenas. Apesar de muitos avanços terem sido feitos, tanto em experimentos in vitroquanto in vivo, ainda são muito poucos os sistemas que já venceram todas as fases de testes para atingir o mercado. Existem muitas dúvidas sobre como esses sistemas de fato funcionam, principalmente quanto ao reconhecimento e à interação das nanopartículas com as diferentes proteínas, mas já há vários sistemas candidatos em avaliação nas agências europeias e na FDA [Food and Drug Administration] norte-americana, especialmente focando o tratamento dos tipos mais agressivos de câncer.
Agência FAPESP – Quais são os nanomateriais mais promissores nesse caso?
Alves – Em termos de materiais, têm sido muito estudadas as partículas de ouro, as sílicas mesoporosas, as nanopartículas magnéticas e, com resultados mais concretos, as técnicas de encapsulamento de fármacos por nanopartículas lipídicas. Como disse, existe muita discussão sobre como essas partículas atuam; no entanto, as pesquisas trabalham com a perspectiva de obter sistemas que sejam capazes de ir exatamente “ao ponto”. Ou seja: atingir somente os alvos biológicos de interesse, mediante o reconhecimento e a alta seletividade.
Alves – Em termos de materiais, têm sido muito estudadas as partículas de ouro, as sílicas mesoporosas, as nanopartículas magnéticas e, com resultados mais concretos, as técnicas de encapsulamento de fármacos por nanopartículas lipídicas. Como disse, existe muita discussão sobre como essas partículas atuam; no entanto, as pesquisas trabalham com a perspectiva de obter sistemas que sejam capazes de ir exatamente “ao ponto”. Ou seja: atingir somente os alvos biológicos de interesse, mediante o reconhecimento e a alta seletividade.
Agência FAPESP – Esses vetores podem apresentar efeitos colaterais importantes?
Alves – Uma das características dos nanomateriais é o fato de suas propriedades serem geralmente aviltadas, quando comparados com seus similares na escala macro. Assim, muitas vezes, conseguimos o mesmo resultado em termos de propriedades com quantidades muitíssimo menores. Espera-se que, no caso dos fármacos, por exemplo, sua transformação em nanopartículas possa vir a evitar efeitos colaterais importantes, uma vez que seriam usadas quantidades bem menores do princípio ativo e se atingiria somente o “alvo” responsável pela doença. Porém, esses aspectos têm de ser comprovados por meio de muitos e longos estudos multidisciplinares, uma vez que várias enfermidades são, na verdade, resultados de diversos fatores atuando de forma sinergística ou cooperativa. Outro aspecto que deve ser considerado, e sobre ele já existem resultados muito bem descritos na literatura, são os fenômenos de biodistribuição. As nanopartículas penetram no organismo, por exemplo, pelas vias respiratórias e, em função de seu tamanho, morfologia e mesmo funcionalização, acabam por se concentrar nos rins ou pâncreas. Vê-se claramente que muita ciência nova ainda terá que ser feita.
Alves – Uma das características dos nanomateriais é o fato de suas propriedades serem geralmente aviltadas, quando comparados com seus similares na escala macro. Assim, muitas vezes, conseguimos o mesmo resultado em termos de propriedades com quantidades muitíssimo menores. Espera-se que, no caso dos fármacos, por exemplo, sua transformação em nanopartículas possa vir a evitar efeitos colaterais importantes, uma vez que seriam usadas quantidades bem menores do princípio ativo e se atingiria somente o “alvo” responsável pela doença. Porém, esses aspectos têm de ser comprovados por meio de muitos e longos estudos multidisciplinares, uma vez que várias enfermidades são, na verdade, resultados de diversos fatores atuando de forma sinergística ou cooperativa. Outro aspecto que deve ser considerado, e sobre ele já existem resultados muito bem descritos na literatura, são os fenômenos de biodistribuição. As nanopartículas penetram no organismo, por exemplo, pelas vias respiratórias e, em função de seu tamanho, morfologia e mesmo funcionalização, acabam por se concentrar nos rins ou pâncreas. Vê-se claramente que muita ciência nova ainda terá que ser feita.
Agência FAPESP – Quais são os principais riscos envolvidos no trabalho com nanomateriais?
Alves – Eles são, em essência, os mesmos que os organismos internacionais e nacionais, responsáveis pela saúde dos trabalhadores, apontam no trabalho com produtos químicos. Acrescentaríamos, aqui, especificidades relacionadas com o tamanho das partículas, que, quando no estado sólido, na forma de pós, requerem instalações com controle rigoroso do ambiente, manipulações em bancadas especiais, equipadas com sistemas de exaustão altamente eficientes, além de equipamentos de proteção pessoal, como luvas, óculos etc. Alguns organismos internacionais, como o Ineris, na França, vêm testando os diversos materiais utilizados para a fabricação de luvas e filtros individuais, para diferentes tipos de atividades em nanotecnologia. Vale destacar que, concomitantemente ao crescimento do número de produtos que utilizam as nanotecnologias, cresce também uma indústria de segurança visando a sua manipulação no ambiente industrial.
Alves – Eles são, em essência, os mesmos que os organismos internacionais e nacionais, responsáveis pela saúde dos trabalhadores, apontam no trabalho com produtos químicos. Acrescentaríamos, aqui, especificidades relacionadas com o tamanho das partículas, que, quando no estado sólido, na forma de pós, requerem instalações com controle rigoroso do ambiente, manipulações em bancadas especiais, equipadas com sistemas de exaustão altamente eficientes, além de equipamentos de proteção pessoal, como luvas, óculos etc. Alguns organismos internacionais, como o Ineris, na França, vêm testando os diversos materiais utilizados para a fabricação de luvas e filtros individuais, para diferentes tipos de atividades em nanotecnologia. Vale destacar que, concomitantemente ao crescimento do número de produtos que utilizam as nanotecnologias, cresce também uma indústria de segurança visando a sua manipulação no ambiente industrial.
Nanotoxicology: materials, methodologies, and assessments
Autores: Nelson Durán, Silvia S. Guterres e Oswaldo L. Alves
Editora: Springer
Preço: US$ 159
Páginas: 411
Autores: Nelson Durán, Silvia S. Guterres e Oswaldo L. Alves
Editora: Springer
Preço: US$ 159
Páginas: 411
Fonte: Agência Fapesp